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The BRIEF

Quem possui o sistema financeiro mais avançado: Brasil ou EUA?

A resposta tem a ver com a “mãe” das inovações: necessidade

22/05/2020, às 12:00

Quem possui o sistema financeiro mais avançado: Brasil ou EUA?

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Todos sabemos que nosso país enfrenta enormes adversidades e desafios, amplificados neste momento de crise mundial. Hoje, comentarei um dos poucos aspectos em que estamos à frente da maioria dos países desenvolvidos: o sistema financeiro. Para ilustrar, farei uma comparação da nossa realidade com o modelo norte-americano.

Nos Estados Unidos, pode parecer surreal, mas:

  • boa parte da população paga as contas de energia elétrica, TV por assinatura, telefonia, aluguel e outras por meio de cheque e pelo correio; normalmente, as cobranças já vêm com o envelope no qual colocar o cheque. Alguns bancos oferecem o serviço de pagamento via site ou aplicativo, mas, dependendo do recebedor, imprimem e enviam o cheque da mesma maneira;

  • não apenas os cidadãos usam cheque, sendo cerca de 50% das transações financeiras entre empresas realizadas por meio desse instrumento ou de dinheiro em espécie;

  • a transferência entre contas de diferentes bancos pode demorar de 3 dias a 5 dias úteis, dependendo da instituição financeira, pois uma parcela significativa das companhias menores (alguns milhares) ainda não tem acesso às redes de pagamento que processam transações no mesmo dia útil.

  •  Afinal, por que deixamos os EUA para trás? A resposta tem a ver com a “mãe” das inovações: necessidade

    Em contrapartida, meios bem mais convenientes, rápidos e seguros de cobrança e pagamento fazem parte da realidade brasileira há muitos anos. Afinal, por que deixamos os EUA para trás? A resposta tem a ver com a “mãe” das inovações: necessidade. 

    Na década de 1980 e início dos anos 1990, nosso país atravessou um período de hiperinflação, e as instituições financeiras passaram a investir em novas tecnologias capazes de proporcionar maior velocidade às transações financeiras, pois dinheiro “parado” ou “em trânsito” perdia valor literalmente a cada dia. Tais ações levaram ao surgimento de instrumentos como boleto, DOC e, mais tarde, TED. Por causa da inflação e devido a riscos óbvios de segurança, mandar cheques ou dinheiro pelo correio simplesmente não era uma opção viável por aqui.

    Também estamos à frente da maioria dos países em aspectos não tecnológicos. Podemos afirmar que, desde 2013, temos um dos marcos regulatórios para mercado financeiro mais avançados sob a ótica de incentivo à inovação e à concorrência.

    Nos Estados Unidos, por causa da legislação vigente, existe uma dependência muito grande dos novos entrantes em relação aos bancos tradicionais e bandeiras. As fintechs norte-americanas parecem mais “correspondentes bancários” do que startups que de fato vão mudar o sistema financeiro. As exceções são algumas companhias que têm maior escala e compram uma licença para operar como banco.

    No Brasil, com a criação do conceito de “instituição de pagamento”, a enorme barreira de entrada para oferta de contas digitais e serviços de pagamento foi eliminada. Atualmente, há mais de uma centena de startups disputando esse mercado com os bancos incumbentes. Algumas fintechs conquistaram bastante representatividade, como NubankMercado Pago e Stone, e foram autorizadas pelo Banco Central a funcionarem sem nenhum tipo de dependência em relação a serviços de instituições financeiras tradicionais. Na prática, tornaram-se “minibancos”.

    Infelizmente, uma parcela significativa da nossa população ainda não consegue acessar os serviços financeiros básicos ou é mal atendida pelo oligopólio de cinco grandes bancos

    Infelizmente, toda essa sofisticação do sistema financeiro nacional não é motivo de comemoração, pois uma parcela significativa da população ainda não consegue acessar os serviços financeiros básicos ou é mal atendida pelo oligopólio de cinco grandes bancos. Entretanto, o crescimento exponencial de algumas fintechs, combinado com iniciativas de Open Banking e de pagamentos instantâneos (PIX), deverá mudar essa situação em breve.

    Estamos experimentando os estágios iniciais de uma revolução que irá proporcionar um direito fundamental à maioria dos cidadãos: serviços financeiros de qualidade a preço justo. Quando esse momento chegar, e será bem mais rápido do que muitos pensam, poderemos nos orgulhar ainda mais dessa trajetória de inovação iniciada nos anos 1980.

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    Alexandre Pinto, autor desta coluna quinzenal no TecMundo, é Diretor de Inovação e Novos Negócios da Matera e especialista em Open Innovation. Na empresa desde 2001, foi responsável pela criação da área de P&D e do seu ecossistema de parceiros.