Considerado uma das maiores revoluções recentes no sistema financeiro do Brasil, o Pix completa um ano nesta terça-feira (16). A tecnologia de pagamentos instantâneos foi lançada pelo Banco Central (BC) — que tem o papel de regulador e gestor das plataformas operacionais — para simplificar as transações econômicas no País.
Antes de 16 de novembro de 2020, os brasileiros estavam acostumados a utilizar métodos eletrônicos de pagamento como o TED e DOC. Enquanto o primeiro demorava horas para ser concluído, o segundo só chegava na conta do recebedor no dia útil seguinte à transação. Além disso, ambos só estavam disponíveis para serem realizados durante dias úteis. TED e DOC continuam sendo oferecidos atualmente, mas praticamente "morreram" após a chegada do Pix.
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Apesar do sucesso do novo sistema de pagamento, a popularidade fez com que a solução entrasse na mira dos criminosos e suscitasse um grande debate sobre novos métodos de segurança. Confira, a seguir, um panorama que o TecMundo preparou sobre o primeiro aniversário do Pix.
Números superlativos
O Banco Central tem uma página especial do Pix com dezenas de informações sobre o programa. Além de esclarecer regras e divulgar o calendário de novidades, o site mostra mensalmente as estatísticas do sistema.
São vários os indicadores divulgados, da quantidade de chaves, números de transações, idades dos clientes e mais. Confira, a seguir, alguns dos principais indicadores do Pix de novembro de 2020 até 31 de outubro de 2021:
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Facilidade para os clientes
A adesão ao Pix impressiona. Em um ano, são cerca de 112,6 milhões de usuários cadastrados no Diretório de Identificadores de Contas Transacionais (DICT), que é a base de dados que registra as informações como a chave Pix de cada pessoa. Do total, são 105,2 milhões de cadastros de Pessoas Físicas (PF) e 7,4 milhões de Pessoas Jurídicas (PJ).
Em relação aos clientes, a adesão é grande por causa de fatores como a facilidade. Hérick Wilke, que é desenvolvedor de sistemas, diz que a desburocratização dos pagamentos é um dos destaques do Pix. Ele lembra que em métodos anteriores os pagadores precisavam saber o número da agência, conta bancária e outros detalhes de quem ia receber o valor.
"Toda essa burocracia fazia ser muito difícil mandar dinheiro para alguém! Fora a questão da agilidade do Pix, que cai em segundos de um lado para o outro. Antes a gente tinha que esperar um tempão, sendo que se fosse transferência do tipo DOC era um dia", lembra sem muita nostalgia.
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Wilke relata ter percebido que as pessoas no seu círculo adotaram o sistema de pagamentos e explica que ele mesmo utiliza a ferramenta em todos os lugares que aceitam. O desenvolvedor conta que passou a utilizar o sistema para pagar contas de telefonia e energia, por exemplo. "Para fazer compras também, já que em vez de ficar digitando a senha do meu cartão de crédito e passando por toda aquela burocracia, acho muito mais fácil só apontar o celular no QR Code e pagar", disse.
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Rafaella Coury, que é designer, afirma que usa o Pix principalmente para transferir valores para colegas, já que pode ser feito de qualquer banco para outro. Apesar de acreditar que a novidade lançada no ano passado foi muito importante e facilitou a vida dos brasileiros, ela afirma que ainda não se sente tão segura realizando as transações financeiras. "Eu tenho uma chave para cada conta minha, uma é o celular e outra o e-mail, pois prefiro não divulgar meu CPF por aí", disse. Apesar disso, ela acrescenta que nunca sofreu nenhuma tentativa de golpe.
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A jovem também acredita que deveria haver mais divulgação sobre o Pix e que outras melhorias poderiam ser feitas, principalmente para que haja mais adesão. "Das poucas vezes que tentei pagar compras online com o Pix, a chave aleatória gerada pelo sistema das lojas não funcionou. Com frequência tive que mudar a forma de pagamento, pois não consegui concluir o pedido. Essa parte precisa urgentemente ser ajustada", ela afirmou.
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Vantagem para os comerciantes
Anderson Barbosa, conhecido como "Don", é barbeiro há dez anos. O salão do prestador de serviço tem um estilo tradicional na estética e também na relação com os clientes. Antes do Pix, os pagamentos eram realizados somente em dinheiro em espécie. A novidade, entretanto, fez com que o profissional alterasse sua forma de receber.
"Antigamente eu trabalhava só com dinheiro por uma questão econômica. A gente que é comércio, ainda mais eu que sou micro, acaba sofrendo um pouco com as taxas das maquininhas dos cartões. E aí eu comecei a adotar o Pix como uma forma de facilitar a vida do cliente, que não precisa mais ir em uma agência sacar, e também pelo sistema ter um custo muito baixo para mim", ele argumenta.
Don comenta ainda que a plataforma de pagamentos oferece oportunidades interessantes como o agendamento de pagamento, que permite com que clientes paguem de maneira antecipada e depois só vão ao salão realizar o serviço.
"99% dos meus clientes pagam com Pix".
"Atualmente eu posso dizer que 99% dos meus clientes pagam com Pix. Eu atendo em uma faixa de pessoas que estão entre os 30 e 50 anos e hoje com a tecnologia do sistema de pagamento todo mundo já tem o acesso. Somente aqueles que não tem acesso a banco ou algo do tipo ainda pagam no dinheiro", conta o barbeiro.
O "Don" tem uma barbearia com um toque tradicional.
O empreendedor Igor Lima é dono de uma hamburgueria na Zona Leste de São Paulo que teve a iniciativa de permitir o pagamento via Pix por causa da facilidade, além dos benefícios financeiros tanto para o seu comércio quanto para o cliente.
"Com o Pix a gente consegue dar descontos e oferecer promoções com mais frequência, por exemplo. Além disso, o sistema dá uma segurança para o cliente, já que ele não precisa andar com dinheiro ou passar o cartão".
Ele reitera o discurso de que comparado aos outros sistemas, como maquininhas de cartões e o popular vale-refeição (VR), o Pix oferece muito mais vantagens. No caso do comércio da hamburgueria dele, que está listada no iFood, a conveniência é ainda maior, já que o aplicativo cobra até 27% em comissões dos restaurantes.
"A cada mês tem aumentado o número de clientes que pagam via o sistema instantâneo [Pix]".
"Hoje, o pagamento por Pix aqui na hamburgueria representa uma porcentagem muito maior do que o dinheiro. Ele ainda não se compara com cartões de crédito e débito, que são muito fortes. Mas a cada mês tem aumentado o número de clientes que pagam via o sistema instantâneo".
Igor Lima enxergou no Pix uma boa oportunidade tanto para o seu comércio quanto para os clientes.
E a adesão não foi grande somente entre clientes e comerciantes. Em relação às instituições de pagamentos, o Pix se transformou quase em uma obrigação. Ao todo, já são mais de 760 instituições que aderiram ao sistema entre as de pagamentos, cooperativas de crédito, sociedades de crédito direto e bancos. O BC informou também que quase 50 outras empresas do ramo financeiro estão em processo de adesão atualmente.
Golpes
Não foram só as facilidades e a desburocratização que o Pix ofereceu aos brasileiros, porém. A ferramenta abriu caminho para que criminosos começassem a explorar novos tipos de golpes em usuários mais desatentos.
Um levantamento divulgado pela Folha de S.Paulo mostrou que — entre dezembro do ano passado e agosto de 2021 — foram registrados, em São Paulo, 202 casos de sequestros-relâmpagos em que os bandidos utilizaram o Pix para roubar as vítimas. A facilidade de realizar uma transferência pelo celular com o sistema fez com que a modalidade correspondesse a quase 30% dos sequestros-relâmpagos no estado.
E esse foi somente um tipo de golpe utilizando ou o sistema ou pelo menos o nome do Pix. Outros esquemas de phishing, promessa de Pix em dobro e até mensagens de WhatsApp e SMS utilizam o sistema de pagamentos como pilar.
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Para tentar contornar os problemas, o BC implementou várias medidas, sendo uma das mais recentes o limite no valor das transferências no período noturno. Desde outubro, os usuários têm como configuração padrão um limite de transferência de no máximo R$ 1 mil entre 20h e 6h. Se a pessoa quiser aumentar esse valor, ela precisa fazer isso manualmente.
Além disso, o BC orienta a população sobre várias dicas que podem ser úteis para evitar possíveis golpes:
- não clicar em links enviados por SMS, e-mail ou aplicativos de mensagens de texto;
- não compartilhar senhas de acesso aos canais de atendimento da instituição;
- não atender telefonemas nem trocar mensagens com pessoas que se dizem funcionárias da instituição detentora da sua conta;
- não navegar em sites suspeitos;
- não baixar aplicativos diferentes do oficial da instituição detentora da sua conta.
Balanço de 1º ano
Realizando um balanço sobre o 1º ano do Pix, Roberto Campos Neto, presidente do BC, elogiou a ferramenta e disse que o sistema serviu para incluir mais pessoas no mundo financeiro. Ele argumentou que o baixo custo, comparado a outras operações, fez com que acontecesse uma revolução no setor econômico.
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"O Pix superou muito nossas expectativas porque além de viabilizar um sistema de pagamentos barato ele criou novos modelos de negócios. A gente tem informação, inclusive, de pessoas que abriram contas bancárias para usar o Pix em seus negócios", disse Campos Neto.
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O diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução do BC, João Manoel Pinho de Mello, salientou que neste primeiro ano o sistema gerou uma grande disputa no mercado e, consequentemente, melhores serviços.
"O Pix gerou muita concorrência e muita economia. Olhando para os bancos, fintechs, empresas de maquinha de cartão, todo mundo disputando clientes para registrar as chaves Pix, o que mostra a concorrência", afirmou Mello.
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A assessora do Banco Central, Mayara Yano, disse que o Brasil foi o país que adotou de maneira mais rápida um sistema de pagamentos instantâneos no mundo. Atualmente, já são mais de 33 transações per capita com a plataforma. O Chile, país até então mais bem-sucedido no quesito, tinha 9 transações per capita após um ano da implantação de seu sistema.
"Cerca de 60% da população adulta do Brasil já utiliza o Pix em seu dia a dia e usufrui dos benefícios que ele trouxe. No caso de empresas, são mais de 8 milhões, ou seja, mais da metade dos empreendimentos que têm relacionamento bancário no Brasil. Em algumas cidades mais de 80% da população utiliza o Pix, como é o caso de Roraima. Em São Paulo, por exemplo, 70% da população já utilizou a plataforma", diz Yano.
Ela afirma, ainda, que o custo baixo, eficiência, praticidade e redução de custos estiveram entre os fatores que fizeram o Pix corresponder a 72% dos meios de pagamento, incluindo DOCs, TEDs, boletos e cheques.
O futuro do Pix
O presidente do BC disse que somente o Pix tem muito potencial para se tornar algo muito maior, e que a evolução do sistema depende do próprio uso das pessoas. Yano comentou que a ideia é democratizar ainda mais a plataforma e que já no final deste mês de novembro devem ser lançadas outras novidades.
Confira, abaixo, algumas das inovações que o Pix deve receber até o final do próximo ano, incluindo no aspecto segurança, que segundo alguns especialistas podem não ser o suficiente para frear os golpes:
- Iniciação de transação: a ferramenta permitirá que um usuário seja automaticamente redirecionado para a tela de autenticação no ambiente seguro do seu banco em caso de compras no comércio eletrônico. A partir do recurso, não será preciso mais abrir o aplicativo do banco para ler um QR Code, por exemplo.
- Pix Saque: será possível transferir uma quantia usando o Pix para uma loja de departamento, por exemplo, e receber o valor em cédulas. A novidade estará disponível a partir de 29 de novembro.
- Pix Troco: parecido com o sistema anterior, só que no caso o cliente poderá fazer uma compra pagando com Pix e receber o troco em cédulas. A novidade estará disponível a partir de 29 de novembro.
- Pix garantido/Pix crédito: a novidade entrará em vigor em 2022 e funcionará como uma espécie de cartão de crédito, já que permitirá que compras sejam parceladas e que o lojista ou prestador de serviço receba as parcelas mensalmente.
- Pix Internacional: permite a realização de pagamentos instantâneos para contas bancárias de outros países.
- Notificação de infração: as instituições financeiras serão obrigadas a notificar e compartilhar com as outras instituições as transações fraudulentas.
- Bloqueio cautelar: a ferramenta permite que a instituição na qual um golpista tem conta já perceba e bloqueie de maneira preventiva os recursos, evitando que o criminoso saque e suma com o dinheiro. A transação fica bloqueada por até 72 horas e passa por uma análise, sendo que se a fraude for constatada, a vítima tem o valor ressarcido.
- Mecanismo cautelar de devolução: permite que pessoas que fizeram um Pix e perceberam que foram enganadas possam bloquear a transação. Por exemplo, o caso de um cliente que transferiu para um suposto familiar que mandou mensagem, mas na verdade o telefone da pessoa foi interceptado. Nestes casos, o usuário tem que abrir um Boletim de Ocorrência ( BO), entrar em contato com a instituição, narrar as evidências e usar a infraestrutura do Pix para conversar com a instituição bancária do fraudador para bloquear os recursos.
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