Por Rafael Bagolin.
Fundo de Garantia parado no Supremo; elegibilidade de ex-presidente votada no TSE; e novo ministro do STF aprovado pelo Congresso. Mas não se fala em outra coisa quando dois ou mais advogados se encontram: ChatGPT.
E é compreensível. Em poucos meses ele saiu do submundo dos entusiastas e passou a ameaçar de extinção algumas profissões. Mas seu criador, Sam Altman, em recente passagem pelo Brasil, afirmou que o número de profissões aprimoradas por essa tecnologia será maior do que as extintas.
E o Direito deve permanecer em que coluna? Na das profissões que serão aprimoradas pela Inteligência Artificial ou aquelas potencialmente extintas?
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Em uma análise objetiva, parece provável que uma IA seja capaz de compilar o saber legal e triangular as situações em que esse saber deve ser aplicado para que possa atender às necessidades jurídicas dos usuários. Talvez nem toda, mas uma boa parte.
A tecnologia e, principalmente, a Inteligência Artificial não tem o poder de extinguir a profissão dos advogados.
Não esqueçamos que o Direito não é uma ciência exata. Se sustenta, muitas vezes, na sensibilidade humana. Na capacidade de interpretar e avaliar situações díspares e sem precedentes com sabedoria, perspicácia e até mesmo empatia.
Além disso, substituir o advogado pela Inteligência Artificial não é algo que dependa inteiramente da tecnologia ou da vontade de seus usuários. A lei exige que processos legais e jurídicos sejam conduzidos por profissionais devidamente graduados e regulamentados. E essa talvez seja uma mudança que a minha geração, ou a de meu filho, não verá acontecer.
O Direito, então, ficaria na coluna das profissões aprimoradas pela tecnologia. A Inteligência Artificial tem muito a contribuir para a produtividade dos advogados, sendo muito mais uma ferramenta do que ameaça. Pelo menos em um futuro próximo.
Cerca de 50% do tempo de trabalho de um advogado é dedicado a microtarefas não relacionadas ao Direito, como cálculos, busca por informações e jurisprudências, assinatura de contratos, etc. Imagina o que representa poder fazer tudo isso em uma fração desse tempo, valendo-se de ferramentas com Inteligência Artificial, como as que desenvolvemos na Jusfy.
O foco nunca é, ou será, criar mecanismos que possam substituir o advogado, e sim respaldá-lo para que ele possa produzir mais e melhor, podendo dedicar-se ao cerne do Direito, trazendo mais benefícios para seus clientes e carreira.
Até porque, a verdade é que uma vez deflagrada, a tecnologia da Inteligência Artificial não pode ser freada. Ela continuará sendo utilizada das formas mais distintas por todo tipo de profissional, e também por usuários que desejam justamente não depender de um profissional.
E aí é chegada a hora de discutir se é moralmente aceitável alguém, sem formação adequada, utilizar a IA para executar o trabalho de profissionais regulamentados e que respondem a conselhos de ética. E também o quão correto é o fato dos mesmos profissionais fazerem uso dela sem uma devida regulamentação. Como o caso de advogados que usam o ChatGPT para redigir petições.
Em abril, o ministro Benedito Gonçalves, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), multou em R$ 2,4 mil, um advogado que protocolou petição redigida com o ChatGPT para participar como “amicus curiae” de um processo.
O ChatGPT e outras IAs podem auxiliam o trabalho de advogados e profissionais do Direito.
O curioso é que resoluções do TSE não preveem intervenção de “amicus curiae”. Mais curioso ainda é que a própria petição diz que seria inadequado o tribunal seguir orientações de um programa de Inteligência Artificial.
Teria o ministro percebido se tratar de peça produzida por IA, não fosse a própria petição afirmar que foi?
Nos EUA, a regulamentação do uso de tecnologias como o ChatGPT já é discutida. Não só para proteger profissões, mas também cidadãos que podem ser alvos da prestação de serviços por parte de quem não possui qualificação. O próprio Altman defende que a regulamentação, apesar de não ser fácil, precisa acontecer “para garantir que não tenhamos grandes erros que possam impactar negativamente o mundo”.
Regulamentar o uso de IAs e, mais especificamente, por parte dos advogados, pode ressignificar a profissão e colocá-la, por um bom tempo, na coluna daquelas que serão aprimoradas.
Mas mais do que isso: dar segurança ao cidadão que necessita de assessoria jurídica, com a certeza de que, mesmo valendo-se de toda a tecnologia possível, seu representante está apto para defender seus interesses.
O mundo, analógico ou digital, sempre terá espaço para bons advogados. E fazer o melhor uso das tecnologias pode definir um bom advogado, daqui pra frente.
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Rafael Bagolin é advogado e CEO Jusfy
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